Posted in Uncategorized on Janeiro 31, 2008 by patriarkill

Dedico essa tradução a todas alt-pornógrafas e odiadoras de mulheres, na esperança de que mudem ou sejam vistas como os verdadeiros agentes do patriarcado corporativo ou financiado que são, e para as meninas que são vitimizadas pelo sistema patriarcal que é, verdadeiramente e basicamente, instalado em cima da prostituição de seus corpos na reprodução, mercado, família e na representação de sua classe como objetos, serviço sexual e capital corporal, dimensões que homens dizem ser as mais significativas de seu ser e que são elegidas como política principal do neopósfeminismo da 3ª onda, e ditas novamente como nossa única forma de ação no mundo.

Prostituição:

Direitos das Mulheres

ou Direitos SOBRE as Mulheres?

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Outubro de 2003

por Elaine Audet

Stella, um grupo de Montreal criado em 1995 que advoga para o direito das prostitutas, tem demandado que a prostituição seja completamente descriminalizada e que haja um reconhecimento das ‘trabalhadoras sexuais’. Essa posição não é aceita com unanimidade. De fato, para maior parte das feministas, prostituição é vista como uma conseqüência da exploração sexual de mulheres, sendo necessário que prostituição seja abolida e haja criminalização dos clientes e cafetões.

Neste necessariamente breve artigo, eu vou focar na prostituição de mulheres adultas, tocando apenas incidentemente a prostituição de homens e crianças e o tráfico internacional de mulheres.

Desde os 70,têm havido uma tendência em torno do reconhecimento do conceito de ‘trabalhadoras sexuais’ no Quebec, Europa e Estados Unidos. Vendo prostitutas como ‘trabalhadoras sexuais’ sugere que elas são meramente trabalhadoras providenciando um serviço ‘social’ e deveria ser dado, então, os mesmos direitos que outros trabalhadores explorados que são esmagados pelas forças da globalização, e tornados em objetos marketizáveis.

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No Quebec, membros de Stella têm falado alto em favor da liberação da prostituição. Eles rejeitam a idéia de que prostitutas deveriam ser treinadas como vítimas e dizem que maior parte das prostitutas tiveram livremente escolhido esse papel, encontrando em seu trabalho uma fonte de empoderamento. Sem dúvida, prostitutas têm uma grande coragem. Testemunhas dessas mulheres, como aquelas nas memórias de prostituição de Jeanne Cordelier, iluminam isso: ‘Quando a porta do quarto bate, não há escapatória…Sem saída, sem saída de emergência.(1)’ Mas a despeito dessa coragem, e os clamores de Stella, não há espaço para ceticismo, especialmente quando o relatório de um estudo internacional mostra que 92% das prostitutas deixariam a prostituição se pudessesm(2).

Um deslize gradual em torno da desumanização

Em debates sobre prostituição, todas palavras são escolhidas, em particular os conceitos de direitos, escolha livre, trabalhadoras sexuais. Considerando o último citado, por exemplo, a ex-prostituta francesa, Agnes Laury, acredita que vendo essas mulheres como ‘mercadorias vendidas por homens a homens’ (3) estaria mais perto da realidade.

Nós vivemos numa sociedade consumista/de consumo onde a prioridade vai para o individualismo e para o consumo irrestrito de pessoas e coisas, e baseado no consumo um dos outros. Em tal contexto, ver prostitutas como trabalhadoras serve para encobrir a oposição feminista ao marketing de mulheres numa escala global. Isso permite os cafetões afirmarem que mulheres fazem isso por ‘escolha’, e mesmo por ‘gosto’, então escondendo o que todos estudos demonstram: que mulheres prostituem a si mesmas por necessidade.

Cultura Patriarcal reside no princípio de que o dever único, e fonte de poder, de mulheres é satisfazendo homens sexualmente em casamento e por prostituição. A existência de prostituição, e ver isso como ‘trabalho sexual’ esconde a extensão desta como escravidão sexual e reinforça a noção de que mulheres são meros objetos inter-cambiáveis que devem ser acessíveis e preparadas para todos homens a toda hora e todo lugar.


Os interesses em aposta.

Quando nós consideramos quem iria enlucrar da liberação da prostituição, se torna claro que NÃO seriam as prostitutas ou mulheres em geral. Ao invés disso, os beneficiários serão os cafetões, os traficantes, o crime organizado, clientes, e todos estes que vêem a sexualidade como nada além dum ato mecânico, deprivado de reciprocidade ou qualquer responsabilidade. Liberação não apenas beneficiará estes, qualquer que seja seu estatus social, que quiser ser apto a tomar poder sobre uma mulher.

É claro, é impossível falar sobre prostitutas como um todo; suas situações divergem consideravelmente de acordo com se elas são chamadas garotas, acompanhantes, dançarinas nuas, strippers, seja se trabalham nas ruas ou em salões de massagem; seja se são autônomas, ou precisam dar maior parte do dinheiro que ganham a um cafetão.

Garotas são frequentemente recrutadas para prostituição em torno dos 13 anos quando muitas foram feitas vulneráveis por violência, pobreza, desemprego, e drogas nos ambientes em que vivem. A maioria experimentou desnudamento forçado por cafetões e membros de gangues de rua que procuram despersonalizar uma mulher até que ela perca a habilidade de agir por sua própria iniciativa ou mesmo pensar por si mesma.

 

Muitas meninas tiveram passado tempo em abrigos, casas de reforma ou prisões, mais da metade têm adicção por drogas. Vivendo e experimentando tais circunstâncias, como pode alguém falar sobre a escolha livre de uma menona/mulher de ser prostituta?

Numa escala internacional, os rendimentos em prostituição estão em torno de $72 bilhões por ano, agora mais lucrativos do que tráfico de armas e drogas. Isso traduz-se em milhões de dólares no Canadá, onde um cafetão coleta em média $144,000 por ano de cada uma das prostitutas (4). Em torno de 5,000 a 10,000 pessoas em Montreal fazem sua vida no negócio da prostituição, muitas outras têm interesse na expansão de tal mercado lucrativo. E dadas as conexões, esses potenciais enlucradores da prostituição têm os recursos financeiros e midiáticos para desviar críticas legítimas da prostituição e para exagerar a importância da divisão dentro do movimento feminista por adotar a posição de uma minoria da ‘livre escolha’ que pretende falar por todas as prostitutas. Ao fazer isso, eles mais suportar a liberação para que retenham seu mesmo controle.

O corpo mercantilizado

O presente movimento de liberação da prostituição está enraizado no movimento geral para livre tráfico, troca comercial, e serve esta aproximação neoliberal por fabricar a prostituição como algo ‘bom’ para a economia. Deste modo, na mídia e no Reino Unido, há uma crescente tendência a apresentar a indústria de sexo como uma solução para os problemas econômicos ou, mais que isso, como um caminho ao desenvolvimento.

Considerando isso, é no interesse da Organização Mundial do Trabalho (OMT) baseado no Reino Unido que promoveu um relatório em 1998 que apoiava a legalização da prostituição porque: ‘A possibilidade de um reconhecimento oficial poderia ser extremamente útil para extender a rede de taxação (impostos) para encobrir mais das atividades lucrativas conectadas com isso. (5)’. Esta posição é clara sobre a admissão de que sexo é uma indústria e que isso pode contribuir diretamente e indiretamente, e em suas formas extendidas, para empregar, para rendimento nacional, e crescimento econômico.

Prostituição constitui uma das formas mais violentas de opressão coletiva sobre mulheres e, com pouquíssimas exceções, é sempre sobre controle coercitivo de cafetões (6). Então, como podemos invocar o uso livre do corpo próprio de alguém como um direito humano quando as condições nas quais prostituição é praticada são tais que explicitamente violam o respeito e a dignidade da pessoa reconhecida pela Convenção para a ‘Repressão do tráfico de seres humanos e a exploração de alguém na prostituição’, adotado em 2 de Dezembro de 1949 pelas Nações Unidas.

Muitas prostitutas, quebrando a genérica ‘Lei do Silêncio’ que as envolve, houveram falado sobre sua constante exposição a toda sorte de humilhações, agressão física e sexual, e assalto, assim como a ‘Roleta Russa’ de relações sem camisinha ou outras proteções. E mesmo se nem todos homens são violentos, aqueles que procuram sexo com prostituas necessariamente compram o poder para ser violento com impunidade. ‘Eu estava com medo, consciente de que a situação poderia se tornar incontrolável a qualquer momento’, diz a prostituta do Quebec (7). Mais ainda, ‘As garotas espancadas que não apresentam nenhum queixa está devolvendo a mensagem de que prostituição é um acordo empacotado…que alguém deve aceitar até mesmo o inaceitável (8).’ Para até quando vai o direito dos homens continuar a ser sistematicamente confuso com Direitos Humanos?


Muitos dos que argumentam pela liberação total da prostituição tentam descreditar feministas que são opostas a essa posição dizendo que em última instância são moralizante, seus discursos, portanto, vitimizantes e estigmatizantes das prostitutas. Todavia, neo-abolicionistas não são responsáveis pelas condições de trabalho das prostitutas ou pela hostilidade daqueles que vêem sua vizinhança transformada num mercado aberto de mulheres e drogas. Por que nós não temos sido aptas a extirpar as causas do problema, devemos legitimar suas conseqüências?

Trilhas para ação

Nenhum indivíduo pode ficar indiferente ao problema que, no fim, diz respeito e toca a nós todas. Está claro que qualquer que ele seja, a liberação da prostituição (e de cafetões e clientes) como demandado por Stella, não vai providenciar uma alternativa real para a crescente miséria de prostitutas e deve mesmo fazer as coisas somente piorarem ainda mais.

Similarmente, há o bloco da proposição quebeconiana para um retorno aos bordéis. Essa ‘solução’ tornaria o Estado no principal cafetão, um paralelo de como o Estado tem substituído a Máfia nos cassinos provincianos. O exemplo da Holanda mostra que leglização institucionaliza e legitima a ‘indústria’ do Sexo, deixa cafetões mascarados como chefes de trabalho e ‘homens de negócios’ legais, e racionaliza o marketing de prostitutas localmente e transnacionalmente.

A única esperança para melhoria da maior parte das prostitutas e acabar com o marketing de mulheres reside no exemplo providenciado pela Suécia que, em 1999, passou uma legislação que criminalizou cafetões e clientes, mas não as prostitutas. Essa política levou a uma redução pela metade no número de prostitutas, mesmo se isso não sucedeu-se completamente na erradicação da prostituição submundana. No entanto, o governo suíço continua a perserverar seus esforços por constantemente injetar novos fundos para programas de desintoxicação, reinserção de prostitutas, e educação dos clientes. Do interesse, e encorajador, é que o Lobby Europeu de Mulheres, compreendendo em torno de 3500 grupos, têm encorajado a adoção por outros governos de uma posição similar a da Suécia. (9).

No Quebec, há um consenso de que os governos de todos níveis deveriam parar de agir em torno das prostitutas como se elas fossem criminosas e, ao invés disso, dar a elas acesso a serviços de saúde, sociais, legais e de segurança que estão requerindo. Debates em torno de grupos no assunto da criminalização de clientes, cafetões estão já sendo submetido às leis canadenses, mesmo se estas tiveram até agora sido aplicadas apenas em formas realmente limitadas.

Em estabilizando polícia aqui, Quebec pode achar inspiração na experiência da Suécia e nas aproximações de cidades como Toronto e Vancouver onde há esforços de dar à prostitutas a ajuda e proteção de que precisam, colocar em questão os meios de resistência a cafetões e traficantes (geralmente os mesmos), e a dissuadir e sensibilizar clientes. A abolição da prostituição pode apenas ser uma estratégia objetiva a longo prazo, mas nós precisamos agora questionar todas relações sociais, econômicas e sexuais de dominação e tomar os passos imediatos para lutar contra pobreza e violência contra mulheres.

‘Para sair fora disso’, diz a ex-prostituta Agnes Laury, ‘Um precisa uma vontade inabalável de não voltar atrás no seu caminho, ser ajudada e no mais das vezes, romper totalmente com o habitat anterior’(10). De forma simples, para ‘sair fora disso’ é passar do estado de vítima para o de ‘sobrevivente’, de uma mulher que luta. É o tempo de todos nós quebrar o silêncio em torno da compra de serviços sexuais e perguntar se este não é na verdade o poder discricionário de homens à violência sexual que sublinha a prostituição, e não a escolha das mulheres.Analisando prostituição desta forma não é uma matéria de puritanismo, mas perguntar por questões éticas fundamentais sobre marketing de humanos. Ao invés de invocar uma ‘escolha livre’ de alguém vender o seu corpo [falsa questão] para justificar a prostituição, não poderíamos nós chamar pelo princípio humanitário, de um limite livremente aceito para o uso de humanos como mercadorias, como foi feito em face do escravismo, para abolir o marketing tanto da sexualidade quanto da reprodução?

Notas

1 Françoise Guénette, entrevue avec Gunilla Ekberg, « Le modèle
suédois », Gazette des femmes, mars-avril 2002, Vol. 23, no 6.
2 Jeanne Cordelier, La dérobade, Paris, Hachette, 1976.
3 Agnès Laury, Le cri du corps, Paris, Pauvert, 1981.
4 Conseil du statut de la femme, La prostitution : profession ou
exploitation ? Une réflexion à poursuivre, juin 2002. Gazette des
femmes . Ce document est disponible en version intégrale (pdf) ou en
version synthèse (pdf).
5 Lin Lean Lim, The Sex Sector : The Economic and Social Bases of
Prostitution in Southeast Asia, Genève, Organisation internationale
du travail (OIT), 1998.
Janice Raymond, Legitimating prostitution as sex work : UN Labor
Organization (ILO) calls for recognition of the sex industry, 1998
6 Delphine Saubaber, « Paroles d’anciennes », L’Express, 22.08.02.
7 La parole aux prostituées
8 Ibid.
9 Françoise Guénette, entrevue avec Gunilla Ekberg, « Le modèle
suédois », Gazette des femmes, mars-avril 2002, Vol. 23, no 6.
10 Les survivantes

Girlswholikeporno ou girlswholikehate

Posted in Uncategorized on Janeiro 2, 2008 by patriarkill

Antes que existira ou pudesse existir qualquer classe de movimento feminista, existiam as lesbianas, mulheres que amavam a outras mulheres, que recusavam cumprir com o comportamento esperado delas, que recusavam definirem-se em relação aos homens, aquelas mulheres, nossas antepassadas, milenares, cujos nomes não conhecemos, foram torturadas e queimadas como bruxas.

– Adrienne Rich.

Tudo está processando-se na historia e está esse velho tema do amor,

o par e os limites

Nós mulheres temos sustentado largas lutas externas e internas com nossas capacidades, de querer ser atuantes de nossos desejos, de nos entendermos mulher e entender-nos mulheres em coletivo; nossos diálogos internos, fundamentalmente, têm sido de feminilidade à feminilidade, ou seja de construção patriarcal a construção patriarcal deste dever de ser nosso corpo mulher.

O diálogo mulher/mulher é mesmo um pendente, pois o diálogo que existe, o que se tem memória, é o que fez na história, é o feminino-feminina. Neste diálogo se prima a alheidade da mulher, é um diálogo “do outro“, é o condicionamento ao amor patriarcal, nunca o amor entre mulheres como conjunto pensante, pois mesmo dentro da construção do amatório temos sido apartadas. Temos tido que nos declarar inteligentemente meio tontas para existir e permanecer no prado marcado e sinalizado da feminilidade e, isto tem mais transcendência do que à primeira vista aparece como uma briga por sobrevivência, sobrevivência que é a custa de nossa dimensão humana, pensante e atuante, é as custas deste diálogo mulher/mulher.

Enquanto não sejamos capazes de interrrogar o desenho do modelo que “tiveram feito outros da nossa erótica”, de nossas formas de erotizar-nos, enquanto não sejamos capazes de aceitar e criar outros modelos, de abrir a atração entre mulheres, abrir a necessidade de entrar em diálogos corporais e erotizados com uma outra Igual, não nos amaremos a nós mesmas, não nos amaremos como mulheres e, fundamentalmente, não nos respeitaremos como gênero. Quando nos interrogamos, recém començamos a meter-nos no mundo, recém começamos a romper a própria misoginia – consigo mesma e com as demais – ; antes é um estar como de convocada, convidada a um sistema que é pensado através de nós mesmas, que se erotiza com nossos corpos, não conosco, senão com essa estranheza sobre nosso corpo mulher com que nos foi significado, sempre um pouco fora, fora do mundo, fora da cultura, fora da política e fora de nosso próprio corpo.

Preocupam-me essas mulheres que se declaram profundamente heterosexuais, que divinizam o corpo masculino, mesmo que seja este mesmo corpo que adoram aquele que as teve submetido à secundaridade como espécie, aquele que as menospreza.


Esta outra memória velada de nós mesmas, que existe, que é parte de nossa história, é toda uma cultura subsumida
na “feminilidade”. Existe uma atração entre mulheres, justamente por toda esta alheidade a que temos sido submetidas, um desejo que poderíamos associar à paixão mais que ao amor, à solidariedade ou à amizade entre mulheres, este desejo de aprender /aprender-nos, de conhecer/nos, de descobrir/nos. Neste lugar da paixão, quem sabe, seja possível entender/nos e entender às coisas que nos passam entre mulheres. Desde a feminilidade construída é muito difícil entender essa paixão entre mulheres, pois que a memória está borrada e não se deixa circular, porque indiscutivelmente o sistema instala a feminilidade misógina, que propõe o ódio à nós mesmas, o menosprezo, mesmo que algumas vezes nos erotizemos este espaço tão significado. Por isso quando nos erotizamos neste espaço tão pré-significado da feminilidade, ficamos estacionadas, não trocamos nada além de “o corpo da erótica”.

A dimensão da paixão e sua memória dentro de nós existe, temos que encontrar/la e significar/la no tempo, há que se registrá-la e fazê-la sair do lugar do nada, já que o patriarcado tem uma preocupação especial de borrá-la, eliminando-a inclusive da memória de nossos próprios corpos porque ali radica sua vigência, ali constitui seu poder. É nossa responsabilidade, nosso desafio, entender e construir esta dimensão do desejo/paixão/de conhecer/nos.

Poderia afirmar que toda mulher conserva essa outra memória/imemoriada, que sua forma de relacionar-se com outra mulher está transpassada por esse conteúdo. Nada poderia propôr-se desde o feminismo e, em especial, desde o feminismo radical, se não passasse por recuperar “esta outra história” de mulheres.

Em todo ser humano existe a potencialidade de atravessar os limites culturais estabelecidos da heterosexualidade, somente se aceita essa potencialidade poderá este desfazer-se dos prejuízos contra as lesbianas e homossexuais e, me atreveria afirmar, que para além de romper com os prejuízos, assumindo esta potencialidade não estática da erótica, poderá começar a recém limpar-se da misoginia do sistema e este não é o mesmo exercício que executam os homens nem os homens heterosexuais, pois eles sempre tiveram amado a si mesmos e amado misoginistamente, estejam onde estiverem.

A amiga íntima e nossos pequenos incidentes lésbicos

As mulheres temos sempre uma amiga íntima, uma outra que nos contém, uma aliada e é com esta outra que se cruzam nossos pequenos incidentes lésbicos, imediatamente negados. Esta negação se enraiza na sensação de terror de descobrir-se pensando ou sentindo passar o limite do permitido na formação dos modelos de erótica e da ética/moral estabelecida. Paraliza-se ante a sanção iminente do sistema, se nega a si mesma, para não ser negada duas vezes pelo patriarcado: uma por ser mulher e a segunda por ser lesbiana. Outras não tantas se recusam a cumprir com o comportamento esperado, são as minorias rebeldes que nos fazem valentes, são as que transitam e assumem o lesbianismo e aquelas que se abrem a compreendê-lo de verdade.

Uma grande parte dos problemas que temos para fazer amizade entre mulheres passa por essa paixão/desejo de conhecer/nos, esta paixão não reconhecida, não historiada, não aceita mesmo nos níveis mais profundos de nossa consciência. A paixão/desejo, ao ser negada e constantemente postergada,se traduz em rechaços, traições e ódios tremendos fora da razão e do tempo, pois que ‘a outra’ a deflagradora desta paixão/desejo sancionada, é a idéia da Eva tentadora do mal, a que faz cair o homem, e que esta vez funciona para nós mulheres, em vez da nossa Eva. É, pois, difícil construir uma amizade, que não esteja prejudicada e permeada por esta proibição misógina de nos amarmos. Que memórias não recordadas trazem, que histórias de sensações de ardores e perdições de nós mesmas traímos por querer-nos, que mandatos a fim de odiarmos, sem sequer entender o que se passa?

Lesbianismo/parelhismo/espelhismo

Como nos querer de outra maneira diferentemente dos papéis, das inseguranças, das demandas de propriedade/fidelidade, sem o drama, o tango, sem o bolero, sem o segredo, sem deslealdades, sem nos atraiçoar-nos constantemente? É nesse espaço amoroso de mulheres de onde podemos reinventar outras formas e amor, este ‘outro amor’, essa suspeita de ‘outra cultura’, onde nos sejamos mulheres pensantes e não inventadas por outros, onde re-desenhar outras formas de convivências entre seres humanos/as que não seja a parelha do domínio.
Posto que o amatório é masculinista, ‘a construção da parelha está patriarcalizada no domínio”, e o patriarcado está em temperado con esta construção convencional do amor parceril. Arma essa escassez de amor em um discurso do amor grande, único, de ‘a dois’, em casal e para sempre, que ao final mata os amores, a uns por culpa e a outros de tanto amor; instala a dor, não o amor. É como a navalha de Robin Hood, porque Robin Hood empunha a navalha do amor, do bom amor, do amor salvador que pouco a pouco se vai confundindo com a navalha de Jack o Estripador, e uma morre sempre de algum destas duas punhaladas, padecem o mesmo, matam o mesmo.
A estética, a beleza do amor patriarcal estão simbolizadas na escrava/dominada, a mais bela de todas: a dominada. A que não ocupará o assento da rainha, a depositária do desejo que não é a metáfora da rainha, pois que a rainha é a mãe dos filhos, a continuadora da linhagem, a segunda (sempre) depois do rei, a guardiã de seus interesses, a custodiadora de seu poder e dos valores que o sustentam. Isto segue vigente, mesmo que pintem às rainhas e às escravas de todas as cores, de todas as modernidades.
A estética e a ética de lesbos é pelo contrário a
horizontalidade, porque nessa horizontalidade que se sucedem os intercâmbios pessoa-pessoa. Esse espaço amoroso devemos desenhá-lo, inventá-lo, temos que narrá-lo para que vá construindo um saber-amar-outro, para que vá acumulando-nos em sociedade de outra maneira, com outra ética e outra estética. Devemos ter cuidado de não readequar a parelha, acreditando que inventamos outro modelo, isso não seria mais que um reacômodo ao mesmo fango patriarcal. A cultura vigente nos faz sentir que somos diferentes, que nossas construções de casal/par são diferentes, ao mesmo tempo que nos submerge a todas em seus costumes e seus valores, fazendo que todos, de uma ou outra maneira, repitam os mesmos modelos.

Reinventar outro tipo de relação/amor leva ao feito de repensar a nós mesmas, repensar nossas formas de relacionar-nos, repensar as estratégias parceris e isto tem uma regra -se é que podemos falar de regras- e é saber não enganar a nós mesmas, e quando falo de enganar, não falo de infidelidades nem fidelidades senão de não disfarçar nada, de não esconder nada, nem proteger-nos, nem proteger a outros; isso tem uma dose grande de valentia, de riscos, de assumir-se sem proteções próprias nem alheias; tem a uma desbravadora, uma aventureira dentro e nada é intocavel, nada é inquestionavel, nada é sagrado; tem um objetivo claro e profundo de fazer-te expressada, livre e mais humana… e isto não deve ser confundido com fazer-se mais boa, porque geralmente é todo o contrário, pois que o “bonismo” amortece, esconde tudo, nega tudo; se arma desde o sacrifício e a hipocrisia… À estas alturas do conto, muitas já sabemos o difícil e doloroso que é… no contar finalmente o conto… quando tem-se mais outro conto.
Se não reestruturamos, re-alimentamos, re-desenhamos, re-humanizamos e repensamos o espaço lésbico, caímos de cara na exaltação patriarcal do romántico amoroso sentimental onde acreditamos estar livres da traição dos homens, exaltando a feminilidade-feminilidade: o amor sem limites dentro da irracionalidade; o amor sentimental, sacrificado, inquestionavel, sagrado; o amor em si mesmo como contido de honestidade, de interesses comuns; este amor que não se pensa, como se não tivesse uma pessoa responsável por detrás com seus valores, sua cultura, suas proposições, sua própria biografia e é, precisamente aqui, de onde o patriarcado tende a trapacear, pois não é o feitio de romper o limite da erótica estabelecida, a transgressão, senão o pensar dita transgressão, desenhar estratégias para que tal transgressão não seja como todas, recuperada.

Se não nos detivermos a repensar o casal[o par], que é a base do clã familiar patriarcal de onde se aprende o poder sobre as pessoas, estaremos repetindo o modelo, ou seja, buscaremos casar-nos, legitimar-nos perante o sistema, ter filhos, e se não tivermos filhos suprir a carência com gatos ou cães que serão cuidados como se fossem filhos; no fim, a cadeia não se detém em estabelecer as imitações da família, a família de mentira que é pior que a família da consanguinidade, e não estou dizendo que não há que se querer as crianças ou aos animais, senão não usá-los como suplentes, nem confundí-los como tão facilmente fazemos, de tratar às crianças como animais e aos animais como crianças.
O casal existe porque existe a lógica do domínio e o jogo do par é o jogo do domínio patriarcal; daí o tópico: “No amor e na guerra tudo se vale”: ter serviço secreto, ter cativos, reféns, estratégias, assaltos, traições, planificação de ataque, imolações, derrotas, vitórias, etc. Essas manobras na guerra se disfarçam atrás do halo heróico salvador, o mesmo que no amor; contudo, no plano amoroso todas essas manobras são pintadas de novela rosa.
Esta cultura não entende nem constrói seres completos e em si mesmos, livres e autônomos, pelo contrário, os faz carentes de tal maneira a ter que completarem-se em outro/outra, dependendo sempre de outro/outra e isto ademais o constrói socialmente. Uma pessoa sem necessidade de completar-se em um outro/outra, com projetos e desejos independentes está em desvantagem ante o sistema, ao mesmo tempo
que está en completa vantagem sobre si mesma, está com o poder de desenhar sua vida, está na libertade. Porém, o sistema que está armado para o casal, sanciona essa liberdade de desenho da própria vida, os vê quase tenebrosos, pois o sistema está pensado para dois e, ademais, está pensado para a parelha reprodutiva, não para indivíduos, nem para sujeitas/os que se vão modificando no tempo com a vida, senão para sujeitos estáticos e conservados de a dois. Muito distinto é falar da liberdade de estar, amar e transitar acompanhado com um outro/outra, que estacionar-se em uma parceria patriarcalizada com a projeção de ‘pela vida’, repetindo o modelo de propriedade.
O sistema arma a parelha (matrimônio) de tal maneira que: um tem o poder e o outro o contrapoder (papeis que se invertem, que nem sempre são estáticos). Cativa às pessoas com o mandato da segurança que proporciona a fidelidade, com a proposta e o anseio por eternidade, com a qual esta construção baseada no amor, termina por encerrar o amor e matá-lo.
Devemos entender que com essa construção do amor não armamos às mulheres vez que somos nós as mais capturadas nelas, nos instala como as próprias guardiãs da feminilidade, havendo que prestar contas, a ter que explicar-se e justificar-se: por que olhou, por que não chegou, por que pensou, por que te foi, por que voltou, por que sonhou, por que gritou, por que se rebelou. Os outros modos, os outros ensaios de convivências são invisibilizados e castigados pelo sistema, pois o sistema está vigiado (Foucault).


Como lesbianas, temos uma história gestual de vida que vai mais além do relato amoroso vigente. Por ela, submergir-se em uma parelha já significada, tem muitos custos, custos de vidas inteiras, do mesmo modo que sair-se das atuais formas de amar con suas fidelidades e lealdades também tem custos de vidas inteiras, não sabemos fazê-lo, não há modelos, não há registro – apesar de haver muitos ensaios silenciados-, não temos idéia de como fazê-lo; com tantas inseguranças, carências e medos com que nos socializam, sofremos muito, porque somente estando submergidas no drama nos sentimos viver e morrer ao mesmo tempo. O drama captura, impede qualquer reflexão que não passe pelos estados obssesivos da dor, poi a cultura vigente está embasada no dor-sofrimento.
Não temos re-simbolizado a vida e menos o amor como para vivê-lo de outra maneira, não temos desentranhado as projeções de propriedade sobre outra pessoa e para que exista uma outra/o como propriedade, pois deve existir uma proprietária/o, uma depositária de nosso sacrifício de entregarmo-nos, e insisto em que o sacrifício é uma armadilha e até que não descubramos o arriscado que é este sistema sofredor, seguiremos permeadas do sacrifício de uns por outros… e não estaremos saindo de toda a hipocrisia antagônica do sistema… Não quero que ninguém se sacrifique por mim nem quero sacrificar-me por ninguém,
não creio em mártires, nem em cruzes para construir o respeito do humano. Recriando parelhas sacrificadas não se constrói o respeito e isto é um gesto profundamente político.


É necessário romper nossas necessidades tão profundamente inscritas com argumentos culturais biologicistas de complementaridade, já que estes têm levado a entender o amor somente em sua dimensão reprodutora, protetora e cuidadora do casal heterosexual, tão funcional a um sistema capitalista e neoliberal.


A parelha lésbica que deverá romper profundamente esta construção cultural, se enreda muito mais que a parelha heterosexual, tão instalada e legitimada: por um lado, se mantém em um meio totalmente hostil que faz com que se unam, se protejam, se encerrem a uma na outra como uma condição de sobrevivência e proteção ante o meio. Por outro lado, ao sairmos deste amor reprodutivo e de domínio, tomamos o discurso do romântico amoroso sentimental. O homem que é infiel por natureza, já não está, não é requerido, nem essencial no jogo amoroso, no entanto, se nos juntamos duas mulheres que somos “a fiéis por natureza”, as que “sim sabem amar”, “as que amamos sem limites”, traduzimos essas fidelidades em clausuras, depositamos-lhe a clausura ao sistema, nos sistematizamos, “nos ordenamos” em par, nos perdemos como pessoas individuais, nos simbiotizamos com a outra em um gesto siamésico, deixando todas as alternativas de libertade, de amor, de vida, de eros, enclausuradas, pois o casal é uma construção cultural criada pelos homens em prol de suas seguranças e acomodações socias; é a
redução minimizada do poder, por ela está sempre em crises e, embora nos empenhemos em esconder dita crise, cada certo tempo voltará a aparecer no horizonte, alucinada com outros eros, outros despertares corporais, outros desejos de libertade.
A parelha já significada faz a gente perder não somente o amor, senão o desejo de aventura, de aventurar-se em outros seres, de aventurar-se a inventar novas sociedades, novas culturas, novas formas de relacionar-se. Faz desaparecer aquele anelo da comprensão, e é justo ali onde aparecem os seres podres por dentro e por fora, toda essa quantidade de seres humanos que não estão vigentes, pois depositaram em outro/a toda sua capacidade erótica, amorosa e criativa, e sem esse outro/outra se trasformam em seres amputados e isto que parecera que pertencia ao mundo do amor, ao mundo privado, é do mundo concreto, da vida cotidiana que construimos como sociedade.
A quem estamos entregando o poder sobre nós? Quanto tempo na história respondemos à família, a que julga, mal/ama e finalmente nos instala em uma sociedade a sua imagem e semelhança? Como poder viver nossos amores e desamores, de tal maneira que sejam
uma proposta de respeito humano e liberdade mais além das proteções e dos sacrifícios dos moldes de propriedade e fidelidade patriarcal?
O dia que tenhamos uma linguagem de narração própria da sexualidade das mulheres, próprio da sexualidade lésbica – não a linguagem da negação que temos tido até agora, não a linguagem da sexualidade legitimada e profissionalizada, hoje tão na moda, resguardada constantemente em sacralidades- poderemos limpar este espaço e lograr que seja diferente.
O amor não é apenas um único na vida, não nasce de gerações espontâneas, existe um fiar de amores, como de colares, que se vão engarçando no tempo. Cada um tem um sentido, cada um traz uma proposta, em cada um vai ficando um pendente, e todos estes pendentes, acumulados, reservados no tempo são os que aparecem reais e concretos no presente amor e este do presente vai a constituir, por sua vez, até o futuro outro pendente… O amor não é um único, nem morre em um acidente na esquina, é um constante de nossas vidas, aparece como aparecem os seres humanos -diferentes-, nos provocam novos desafios de entender-nos, novos desafios de redesenhar-nos e sanar-nos do “maltrato cultural”,
de entender que há várias maneiras de entender o compromisso por outra pessoa, o sentir amor enquanto dure o sentimento, e este compromisso só pode ser o cuidar o mais que se possa deste sentimento, que uma vez que começa, também começa a desaparecer; como tudo na vida, tem um início, um tempo e um fim.

Se os sonhos, os amores e as liberdades que não se vivem, se morrem por dentro… te apodrecem, te matam pouco a pouco. Olha como está este mundo sem sonhos, sem amores, sem liberdades, morrendo.

Somos Nós mesmas as que temos que…


Repensar nossas formas amorosas de nos relacionarmos, repensar nossas formas políticas de nos relacionarmos, religá-las, pois são políticas. Se como lesbianas queremos instalar-nos na parelha patriarcal, não estaremos mudando nada mais que o corpo de nosso desejo erótico; mudamos o corpo masculino pelo feminino, mas com a mesma cenografia para montar o mesmo conto, não estamos propondo nenhuma mudança além do desejo de legitimação como grupo minoritário. Ao mesmo sistema que nos deslegitima o suplicamos que nos legitime, fazendo-o duplamente poderoso. E quando falamos de sistema estamos falando desde o núcleo familiar até as instituições, todos constituídos por seres de carne e osso. É aí que perdemos o rumo, pois não pode existir uma modificação do sistema através de nós mesmas, senão um acomodamento de nós ao sistema, por isso me surpreendo de ver que existam lesbianas que queiram casar-se ou que desejem ser parte do exército… mais para além do direito de igualdade e as vocações de cada uma, creio que há que repensar a vigência do matrimônio, pois é uma instituição tão patriarcal como os exércitos. Temos que separar águas com quem quiser dar continuidade a um sistema injusto, arbitrário, racista, baseado na propiedade privada e na primazia do homem branco.
Um movimento lésbico-político-civilizatório, repensa todos os elementos que tramam o sistema e deste lugar desenha suas estratégias políticas. Não pode entregar sua reflexão a outros grupos marginalizados, pois a única coisa que as une a outros grupos marginalizados é somente o feito da marginalização. Não temos os mesmos interesses políticos que os ecologistas, que os gays, os travestis – que são os que têm retomado e reinstalado o discurso da feminilidade- nem com os diferentes projetos dos partidos políticos, nem das igrejas, etc.


Sem pensar/nos e re/pensar o movimento lésbico político civilizatório, não poderemos desarticular o sistema, pois sem este reanalizar-nos, não saberemos se não é desde dentro do próprio movimento lésbico que estamos traindo nossas políticas e nossas potencialidades civilizatórias.
A análise da realidade desde a cultura vigente e suas propostas, é
uma realidade que não existe para nós, é uma realidade onde nunca estivemos, nem estaremos, nem estamos, nem nos pertence como análise, por isso devemos revisar muito cuidadosamente a necessidade de aderirmos a qualquer análise ou proposta de mudança que não provenha de nós mesmas, recuperar nossas próprias reflexões, nossa própria história política, pois obviamente não temos os mesmos interesses de outros grupos marginalizados; podemos fazer alianças circunstanciais, mas não deixar que nosso discurso seja tomado por outros, que se perca em outros.
Sentindo-nos ‘tão fora do sistema’ nos baixam nostalgias de legitimidade, e essas nostalgias nos fazem perder-nos e traem nossa história, terminamos por querer estar no centro mesmo do poder, quando o desafio político é não formar parte do sistema, não colaborar com o mesmo sistema que há poucos anos nos queimava nas praça públicas e que de outra maneira, menos visível, nos segue queimando, nos segue perseguindo, nos segue reciclando.

Há um limite ético e político com nós mesmas e nosso corpo; por isso, deixar as coisas como estão, já não é possível, não existe essa realidade para nós.

Margarita Pisano 16 de outubro de 1997

Posted in Uncategorized with tags , , , , on Novembro 29, 2007 by patriarkill

Teoria Queer e Violência Contra a Mulher

março 2004

Por Sheila Jeffreys

Eu quero falar sobre como queer e teoria pós-moderna afetaram a habilidade de feministas e lésbicas de organizar-se contra, ou mesmo reconhecer violência contra mulheres. Na teoria queer e pos moderna, baseada no individualismo liberal, formas importantes de violência são renomeadas ´transgressão´, ´escolha´ ou ´agência´. Eu vou concentrar nas 3 formas de violencia aqui, a prostituição de homem abusando de mulheres, a violência de operações transexuais e a violência da industria da modificação corporal.
Meu ponto de partida é aquele velho mas pouco compreendido slogam feminista: ´Nosso corpo nós mesmas´. Em relação à violência, eu sugiro, isso tem dois importantes significados:

1/ A objetificação de mulheres no qual os corpos são tratados como objetos para outros usarem, à revelia de nossa vontade ou pessoalidade, como em estupro, abuso infantil, prostituição, são danosos para nós mesmas. O que é feito aos nossos corpos afeta a nós. Para sobreviver aos usos abusivos ou violentos de nossos corpos nós temos que aprender a dis-associar* para sobreviver. Em relação a prostituição o entendimento de ’nosso corpo, nós mesmas’ nos capacita reconhecer o mal da dis-associação que mulheres prostituídas tem de fazer uso de forma a sobreviver a violação de seus seres é constituiída pela violência sexual comercial.

2/ O slogam ’Nossos corpos, nós mesmas’ também significa que nossos corpos não são o problema. Esse foi o entendimento que deu base aos grupos nascentes de conscientização que capacitaram tantas mulheres a aceitar o formato de seus corpos e abrir mão de maquiagem e outros disfarces. Os problemas que mulheres e homens podem ter com as formas de seus corpos, configuração genital, são politicamente construídos em uma sociedade de supremacia masculina na qual mulheres, e alguns homens, são sexualmente e fisicamente violados por homens, na qual construções de gênero e de corpo perfeito são usadas para reinforçar controle social e a criação de uma dominação masculina e subordinação feminina. Descontentamento com nossos corpos que surge dessas condições políticas é um problema político, e a mutilação de corpos é uma ação que visa cortar fora os corpos para fazê-los caber dentro de um sistema político abusivo ao invés de procurar mudar o sistema para caber os corpos que de fato as pessoas têm.

Um valor básico feminista é a criação de uma sexualidade da igualdade na qual nós podemos permanecer em nossos corpos e celebrá-los como o são.

Em condições de opressão nenhuma dessas coisas é fácil. Nos anos 80 houve um backlash (reação) contra esses entendimentos fundamentais do feminismo. Feministas que trabalhavam em pornografia, em abuso sexual, em maquiagem, em sapatos de salto alto e outras belezas prejudiciais foram então tachados de: politicamente correto, puritanismo, anti-sexo.

As forças que alimentaram esse backlash:

1/ Liberalismo. O ponto de partida de feministas radicais que restringiram a compreensão de políticas para o mundo público, ganhou status nos 80 e 90. O ponto de vista de feministas liberais estadunidenses como Katie Roiphe e Naomi Wolf, e a jornalista britânica Natasha Walters, tão amada dos editores e da mídia, que mulheres são igualmente empoderadas o bastante para lidar com todos esses inconvenientes de suas vidas privadas, assédio sexual, estupros em namoros, espancamento, fazer todo trabalho de casa, de fato se torna exatamente como o liberalismo que dá suporte a políticas queer e pós-modernas.

Mulheres precisam ser ’power feminists’ [feministas empoderadas] diz Naomi Woolf. Nós estamos livres para usar maquiagem mas é supreendentemente certo de que são ainda mulheres que estão escolhendo essa forma de empoderamento. Aparentemente há um nível de campo lúdico mas homens não estão se aglomerando para retirar suas olheiras, usar batom, sapatos torturantes e saias curtas apertadas.

Práticas de violência são justificadas sob a rubrica do consenso. Sadomasoquismo, prostituição e cirurgia plástica não são compreendidas como práticas de opressão criadas através de relações de poder desiguais em supremacia masculina. Elas são portadas como invenções femininas para o prazer de mulheres ao invés de práticas tradicionais danosas.

A fetichização de consenso e escolha e seu set aplicado a estupro em namoros, é adotado de maneira ardente por pós-modernistas e teoristas queer que promovem sadomasoquismo e prostituição, transexualismo e body modification como o máximo em auto-realização e empoderamento.

2/ Pos-modernismo. Um set de idéias criado marjoritariamente por homens gays e em geral ininteligível. Homens intelectuais franceses vêm sendo adotados com aparente entusiasmo por muitas acadêmicas feministas e teóricos queer nos anos 80 e 90. Essas idéias foram sendo empregadas eu sugiro que seja porque algumas mulheres e homens gays queriam carreiras acadêmicas que são bastante difíceis de sustentar se você manter uma perspectiva feminista radical. Apenas as idéias de homens respeitados por outros homens farão você ir longe na acadêmia. Então feministas e homens gays vestiram as idéias do sadomasoquista Michel Foucault, por exemplo. Ele se tornou mais popular que Marx era nos 60 entre os trendies e progressistas. Em muitos departamentos como os de estudos culturais ele esteve e é compulsório.

O que essas idéias contribuiram para feminismo e o entendimento da violência? A idéia de que não há algo do tipo ’mulher’. Que isso é essencializante, e inaceitável é falar da experiência de mulheres ou opressão das mulheres porque mulheres são todos indivíduos completamente diferentes.  Opressão adicional não existe porque poder apenas flui sem direção, apenas constantemente recriando a si mesmo nas interações de pessoas bem intencionadas, na comunicação. Não há algo como ’verdade’, o que convenientemente permite um relativismo moral no qual é bastante fora de moda protestar contra qualquer comportamento ou condição de opressão.

Essa é uma teoria espetacularmente inadequada para analisar violência e assim, graças a isso, não muitas feministas pós-modernas tentam fazê-lo. Elas estão mais interessadas em mídia, representações e fantasia, não em comportamento real ou circunstâncias materiais. Quando elas se aproximam de violência os resultados são bizarros. Sharon Marcus sobre estupro nos diz que estupro ocorre porque mulheres erraram no script. Se mulheres forem capazes de mudar o script então homens não as estuprariam. Isso desloca a culpa pelo estupro de volta às mulheres, algo que feministas tiveram sempre tentado mudar. Shannon Bell nos conta que não há ’significado inerente’ para prostituição. Se fosse o caso de que prostituição não possui significado em termos de relações de poder, então homens estariam se alinhando nas ruas para serem pegos em carros por mulheres que desejariam defender as coisas no seu âmago. É realmente difícil de sobrever assim as relações de poder na prostituição mas pós-modernistas podem fazê-lo.

Feministas pós-modernas nos dizem que o corpo é um texto. Não verdadeiramente real, mas um texto que pode ser rentavelmente reescrito. Então feministas pós-modernas são usadas pra justificar body modification. O ezine de body modification tem artigos justificatórios que citam teóricas ’feministas’ como Elizabeth Grosz e Judith Butler para legitimar as práticas anunciadas nos websites, tanto que página após página de propagandas de diferentes estúdios de piercing e cutting de todo o mundo ocidental com fotos de suas mercadorias. As fotos mostram partes na maior parte de corpos de mulheres lacerados, costas esfoladas abertas, músculos de carneiros com desenhos grandes e sangrentos neles cortados, estômagos simplesmente cortados sem qualquer desenho particular. As webpages muitas vezes portam bandeiras do arco-íris e o slogam ’assumida e orgulhosa’. Essas jovens lésbicas estão apenas reinscrevendo o que nós fomos orientadas.

3/ Teoria Queer. A teoria queer adapta s idéias dos pós-modernistas para os interesses de alguns homens gays. Elas são usadas para re-nomear formas variadas de violência como sadomasoquismo e transexualismo como ’transgressão’. Teoria queer é grande na importância da ’transgresssão’ das fronteiras corporais o que acaba por significar carregando formas de violência em cima disso. O entusiasmo com ’transgenerismo’ muitas vezes dito ser diferente de transexualismo também requer maior reformatação do corpo ofensivo com substâncias químicas se não cirurgia atual. Em teoria queer mulheres prostituídas são transformadas em uma minoria sexual, ou em um ’movimento de afirmação’ junto com outros praticantes ou vítimas de violência como sadomasoquistas, pedófilos, transexuais e vistos como rebeldes criando um novo futuro sexual. De fato, claro, mulheres prostituídas estão tendo que dis-associar para sobreviver, e não sendo liberadas sexualmente. Estão servindo à liberação sexual de seus colonizadores, os homens.

De fato as práticas de violência que são celebradas em teoria queer podem todas ser vistas como resultantes da opressão. Mas teoria queer, sendo baseada em individualismo liberal, não reconhece as políticas como sendo concernentes ao templo do privado. Sexo é privado e além das análises apesar de que as políticas queer demandam que homens gays sejam empoderados para clamar largas áreas do espaço público nas quais pratiquem seu sexo ’privado’. Essas áreas nas quais mulheres são feitas se sentirem desconfortáveis ou nas quais sejam feitas parecer muito perigosas para mulheres se aventurarem, por causa do delicioso senso de medo e apreensão que homens gays criam em campos de caçada por silenciar e rondar estão agora sendo oficialmente designadas como ’ambientes de sexo publico’ por exemplo nas políticas de HIV nas cidades escocesas. Logo homens gays apropriaram-se de largos pedaços de parques, fontes, ruas como sua possessão própria.

Políticas Queer  nas formas de grupos como Sex Panic [Pânico Sexual] nos EUA e Outrage [Ultraje ou numa leitura dúbia, Raiva pra Fora] no Reino Unido, milita pelos direitos individuais de homens gays para injuriar outros em sadomasoquismo para seu entretenimento, a usar garotos em prostituição e pornografia, de adquirir espaço público para suas práticas. Um homem foi recentemente condenado por assassinato em Melbourne por enforcar outro homem na prática sadomasoquista de asfixiamento. Esse homem, proeminente em sadomasoquismo gay em Melbourne, um businessmen do sadomasoquismo associado com gerenciar clubes de SM para lucro, roubou os cartões de créditos do homem morto e seu carro e fugiu para o norte em Queensland. O bom é que ele pegou 5 anos de prisão. Minha perspectiva de todas essas práticas de violência sobre eles como sadomasoquismo, transexualismo e mutilação é que os perpretadores estão sempre errados. Não importa o quanto alguém peça para ser abusado é ainda assim errado complacer e é particularmente chocante fazer lucros em cima disso.

O que liberalismo e suas formas mais fashionáveis em pós-modernismo e teoria queer vem fazendo é desaparecer o opressor. Todas práticas de violência são vistas como ’escolhidas’ por agentes desejosos de, e visto também como politicamente progressivo e transgressivo.

Práticas Tradicionais Prejudiciais

Eu quero procurar com mais detalhismo de onde essas práticas de violência surgem e sugerir que elas de fato deveriam ser reconhecidas como práticas tradicionais prejudiciais. Em 1995 os Estados Unidos publicou indicadores de  ’Praticas Tradicionais Prejudiciais e seus efeitos na saúde de mulheres e crianças’. As práticas descritas pelos indicadores sociais eram quase todas não-ocidentais. Elas incluíam mutilação genital feminina, casamento infantil, preferência do filho, alimentação forçada. A única prática listada que claramente dá cobertura também às culturas ocidentais é violência contra mulher e nessa prática está incluida prostituição.

Eu penso que é uma maneira bem útil de entender prostituição assim como as outras práticas de violência que eu venho discutindo aqui. Prostituição cabe muito bem dentro do critério de reconhecimento de uma prática tradicional prejudicial como definida pela UN.

1/ Prejudicial para a saúde de mulheres e crianças : Isso é certamente prejudicial para a saúde de mulheres e crianças pelo dano à auto-estima, tendências suicídas e auto-mutilação, doenças sexualmente transmissíveis e HIV, dano aos sistemas reprodutivos, gravidez indesejada, uso de drogas pra aguentar a violação e para prender mulheres e crianças à cafetçies e bordéis.

2/ Emerge da subordinação de mulheres : prostituição claramente surge da subordinação das mulheres. É uma prática na qual as vítimas são mulheres e crianças expostas e os perpretadores são quase totalmente homens através da história e culturas. Essa é uma prática que explora o despoderamento de mulheres e crianças, economicamente, fisicamente e em relação com dominação masculina adulta e a submissão de mulheres e crianças.

3/ Suportada pelo peso da tradição : prostituição é frequentemente descrita pelos apologistas como ’a profissão mais antiga’ o que, longe de ser uma justificação, de fato poderia ser vista como uma particular acusação das sociedades ocidentais presentes que aclamam a si mesmas progressivas e comprometidas com igualdade embora mantenham séculos de velhas formas de escravidão em relação a mulheres e crianças.

4/ Toma uma aura de moralidade : uma vez que é fácil ver em relação à tais práticas de mutilação genital feminina desde envolvimento de mulheres na prostituição tem tradicionalmente levado a punição e isolamento social, é possível ver prostituição ganhando uma aura de moralidade agora com sua legalização em muitos países incluindo Victoria na Austrália onde eu vivo. Quando o relatório ILO (1) do último ano em prostituição chamado ’O Setor Sexual’ chamou pelo reconhecimento da utilidade da prostituição para as economias da Ásia Sudeste então o status de prostituição como uma indústria se não de mulheres prostituídas por si mesmas, está mudando rapidamente. Certamente prostituição se não sempre vista como moral é vista como inevitável na maior parte dos países do mundo e isso mostra a natureza profundamente enraizada de sua aceitação, sua implantação nas culturas de dominância masculina.

5/ Escolhida e infligida sobre mulheres por si mesmas: apesar disso não estar no critério oferecido pela UN de práticas tradicionais prejudiciais Eu penso que é um elemento importante da maioria deles, excluindo reconhecida violência masculina como em estupro de crianças e violência doméstica. Em muitas das práticas nas quais mulheres e crianças do sexo feminino são preparadas para o casamento e escravidão sexual, mutilação genital feminina, alimentação forçada etc. mulheres são as torturadoras de outras jovens mulheres como Mary Daly apontou em sua análise dos sado-rituais que concordam muito bem com o que a UN agora chama de práticas tradicionais prejudiciais. Homens são removidos pra longe da paisagem e sua responsabilidade difícil de ser reconhecida. Em algumas práticas, como na queima de viúvas em Rajasthan, mulheres são vistas como abraçando a morte voluntariamente a morte na pira funerária de seus maridos. As culturas qme que essas práticas são tocadas criam pressões sociais tão forçosas que recusa parece impossível e ’escolha’ é inimaginável. Em culturas ocidentais mulheres são vistas como livremente escolhendo prostituição enquanto os abusadores masculinos são invisíveis. Isso pode quase ser visto como se mulheres fossem para dentro dos quartos e fizessem a prostituição toda por si mesmas. Os homens precisam permanecer invisíveis como se o mal social de seu comportamento de prostituição para com as mulheres que eles tem relacionamentos fosse pra ser escondido. Em Victoria agora nós estamos ouvindo mais e mais histórias de mulheres cujo casamento de 25 anos ou mais foi destruído pelo comportamento de prostituição de seu marido, comportamento que ele vê como justificável num estado no qual prostituição é uma empresa estatalmente licenciada, regulada e taxada que exibe suas mercadorias no centro de exibição do estado. A dor das mulheres na descoberta, repentina, de fotos de jovens moças nuas da mesma idade de suas filhas integradas com os feriados familiares estala e vai pensando na agonia de serem culpadas pelos parentes por não dar aele o bastante, perdendo a lealdade das crianças que tomam partido do pai abusivo. Tudo isso é o mal de uma escala massiva que está institucionalizada pela legalização da prostituição.

6/ Justificada com as ideologias dos homens : Mary Daly também, fala de como os sado-rituais são justificados e celebrados nas ideologias masculinas e nas academias. Isso é onde entra as ideologias que eu venho observando aqui, as ideologias que consentem com ou legitimam práticas de violência, liberalismo, pós-modernismo e teoria queer.

O ocidente tem uma cultura em que práticas de violência e opressão são escondidas, responsabilizadas nas vítimas pelas idéias de ’escolha’ liberal ou celebradas. Eu gostaria de acrescentar lésbicas e gays às constituições opressivas que são as vítimas das práticas prejudiciais tradicionais. O status oprimido de lésbicas ou homens gays, combinadas com a experiência de violência sexual de homens na infância, está construindo eles como constituintes das indústrias de transexualismo e modificação corporal na qual histórias dolorosas são literalmente cortadas dentro dos corpos das vítimas para enlucramento. Transexualismo tem uma longa história. Muitas culturas tem escolhido construir uma dominação masculina cuidadosamente regulamentada e uma subordinação feminina por convocar em uma terceira categoria aquelas crianças masculinas que não cabem nelas ou são desejadas por outros homens para uso em prostituição. Isso não é uma história ilustre mas uma história de opressão, a qual queremos pôr um fim.

Automutilação (cutting), piercing e tatuagem, infelizmente, não são apenas moda. Para muitas vítimas de violência sexual e opressão de lésbicas e gays cutting se tornou uma obcessão, uma forma de carregar pra fora deles com a égide da aceptabilidade a auto-mutilação que eles poderiam de outra forma performar com culpa em seus próprios quartos. Penectomias, a perfuração de gargantas, facas perfuradas estreitamente pelos corpos, tatuagens faciais, tem repercurssões. Elas são potencialmente fatais, afetam prospectivas de emprego, podem levar a perda de poder de fala, infecções por HIV e muitos outros riscos. Cortar-se leva a gente pra um caminho longe do insight original feminista de Nossos Corpos Nós Mesmas, que eles são bons e legais e não merecem violência, constrição, ser escondidos com maquiagem ou véus, lacerados com cirurgia plástica ou operações transexuais. As práticas de violência que eu tenho olhado aqui, prostituição, transexualismo, cutting, sugerem que a brutalidade da opressão da mulheres, crianças, lésbicas e homens gays nas culturas ocidentais nas quais os oprimidos tem que dis-associar ou irrelevar pra sobreviver. Mas esses liberais que querem-nos acreditando que nós vivemos no melhor de todos mundos possíveis, abençoado com uma posição num campo de jogos de iguais oportunidades, devem culpar essas práticas nas vítimas através das idéias de escolha, ou distorcer seus significados ou celebrá-las através das ideologias queer ou pós-modernas. No Canadá hoje, como na Austrália práticas tradicionais prejudiciais de violência estão vivas como nunca e a gente precisa estar habilitada pra identificar elas claramente e em opôr-se, sempre, a quaisquer tentativas de justificá-las ou de construir indústrias rentáveis em cima delas. Estúdios de auto-mutilação, bordéis, deveriam ser como impensáveis assim como a idéia de construir indústrias em cima de mutilação genital feminina (apesar de que,claro, revistas de modificação corporal usarem fotos de garotas e mulheres mutiladas para a satisfação pessoal dos homens).

Notas
(1) Lim, Lin Lean (ed), The Sex Sector : the Economic and Social Bases of Prostitution in Southeast Asia, International Labour Organization, Geneva, 1998.
Janice G. Raymond,
Legitimating Prostitution as Sex Work : UN Labour Organization (ILO) Calls for Recognition of the Sex Industry Part One and Two, December 1998.

Referências
Mary Daly, Gyn/Ecolgy – The Metaethics of Radical Feminism Boston, Beacon Press, 1978, 1990.
Sheila Jeffreys, Unpacking queer Politics, Cambridge UK, Polity Press, 2003.
Sheila Jeffreys, The Lesbian Heresy, Melbourne, Spinifex Press, 1993.
Janice G. Raymond, The Transsexual Empire, New York, Teacher’s College Press, 1979, 1994
.

Apresentado em Vancouver Rape Relief fundraising dinner, 24 Setembro de 1999.
© Sheila Jeffreys

* Dis-associação ou Aprendendo a Dis-associar: Muitos sobreviventes de trauma são familiares com dissociação. É uma habilidade primária usada para encobrir sentimentos. Algumas pessoas com repetidas experiencias de eventos traumáticos particularmente na infância, aprender a dissociar bem cedo na vida. Dissociação significa escapismo mental e emocional quando fuga física não é possível Por exemplo, dissociação significa não permitir a situação dolorosa adentrar a consciência. Também pode significar bloquear seu impacto emocional por compartimentalizar o trauma. Isso permite aos sobreviventes desatachar-se do evento traumático, ajudando a desviar do seu impacto total. Se você dis-associar, você pode estar perdendo tempo, tempo que você não poderá contar ou tempo no qual você não estará certo de suas ações. Quando um evento é encobrido, ou quando esse evento é muito doloroso para tolerar, é natural e auto-protetivo aprender a dis-associar.[ Life After Trauma: A Workbook for Healing by Dena Rosenbloom, Mary Beth Williams

Posted in Uncategorized on Novembro 12, 2007 by patriarkill

Bunch, Charlotte.  “LESBICAS EM REVOLTA”

As Fúrias: Mensal Feminista/Lésbico, vol.1 (Janeiro 1972), pp.8-9

LESBICAS EM REVOLTA

Tremores e Arrepios na Supremacia Masculina

O desenvolvimento de políticas Lésbicas-Feministas como a base para a libertação das mulheres é nossa prioridade maior, esse artigo contorna nossas idéias presentes. Em nossa sociedade que define todas pessoas e instituições para o benefício dos ricos, homens e brancos, a Lésbica está em revolta. Em revolta porque ela define a si mesma nos termos das mulheres e rejeita as definições dos homens de como ela deve se sentir, agir, aparentar e viver. Ser uma lésbica é amar-se a si mesma, mulher, numa cultura que denigre e despreza mulheres. A Lésbica rejeita a dominação sexual/política masculina, ela desafia seu mundo, sua organização social, sua ideologia, e sua definição dela como inferior. Lesbianismo coloca a mulher em primeiro lugar enquanto a sociedade declara o macho supremo. Lesbianismo ameaça supremacia masculina ao seu núcleo. Quando politicamente consciente e organizado, é central em destruir nosso  sexista, racista, capitalista e imperialista sistema.

Lesbianismo é uma escolha política

Sociedade masculina define Lesbianismo como um ato sexual, o que reflete a visão limitada das mulheres: eles apenas nos pensam em termos de sexo. Eles também dizem que Lésbicas não são mulheres reais, logo, uma mulher real é aquela que é fodida por homens. Nós dizemos que uma Lésbica é uma mulher a qual o senso de si e de energias, incluindo energias sexuais, centram em torno de mulheres – ela é identificada com/como/na mulher (Mulher-Identificada). A mulher-identificada com mulher compromete a si mesma às outras mulheres para suporte político, emocional, físico e econômico. Mulheres são importantes pra ela. Ela é importante pra si mesma. Nossa sociedade demanda que o comprometimento das mulheres seja reservado aos homens.

A Lésbica, a mulher-identificada com mulher, compromete a si mesma às mulheres mão apenas como uma alternativa aos relacionamentos opressivos homem-mulher, mas primariamente porque ela ama mulheres. Seja conscientemente ou não, pelas suas ações a Lésbica reconheceu que dando suporte e amor a homens sobre mulheres, perpetua o sistema que a oprime. Se mulheres não fizerem um comprometimento dumas com as outras, que inclua amor sexual, nós negamos a nos mesmas o valor e amor tradicionalmente dados aos homens. Nós aceitamos nosso status de classe secundária. Quando mulheres dão energias primárias a outras mulheres, então é possível concentrar-se plenamente em construir um movimento para nossa libertação.

Lesbianismo identificado-em mulher é, então, mais do que uma preferência sexual, é uma escolha política. É político porque relações entre homens e mulheres são essencialmente políticas, elas envolvem poder e dominância. Uma vez que Lésbicas rejeitam ativamente esses relacionamentos e escolhem mulheres, ela desafia o sistema político estabelecido.

 

Lesbianismo, por si mesmo, não é o suficiente

 

É claro, nem todas Lésbicas  são conscientemente mulheres-identificadas, nem são todas comprometidas em achar soluções comuns para a opressão que elas sofrem como mulheres e Lésbicas. Ser uma lésbica é parte do desafio à supremacia masculina, mas isso não é o fim. Para a Lésbica ou mulher heterosexual, não há solução individual para a opressão.

 

A Lésbica pode pensar que ela é livre uma vez que ela escapa da opressão pessoal dos relacionamentos homem/mulher. Mas para a sociedade ela ainda é uma mulher, ou pior, uma Lésbica visível. Nas ruas, no trabalho, nas escolas, é tratada como inferior e está sob a custódia dos caprichos e poder masculino. (eu nunca ouvi falar de um estuprador que parou porque sua vítima era Lésbica). Esta sociedade odeia mulheres que amam mulheres, e então, a Lésbica, que escapa à dominância masculina em seu lar privado, recebe-a em dobro das mãos da sociedade masculina, ela é assediada, isolada e calada ao máximo. Lésbicas precisam se tornar feministas e lutar contra a opressão das mulheres, assim como feministas precisam se tornar Lésbicas se elas esperam pôr fim à Supremacia Masculina.

A sociedade estadunidense encoraja soluções individuais, atitudes apolíticas e reformismo para nos manter aquém de revolta política e afastados do poder. Homens que comandam e machos esquerdistas que desejam governar tentam despolitizar sexo e as relações entre homens e mulheres de forma a nos prevenir de atuar para pôr fim à nossa opressão e desafiar seu poder. Assim que a questão da homossexualidade se torna pública, reformistas definem-na como uma questão privada de ´com quem você dorme´ no intento de retroceder nosso entendimento das políticas de sexo. Para a Feminista-Lésbica essa não é uma questão privada, isso é uma matéria política de opressão, dominação e poder. Reformistas oferecem soluções que mantém o poder nas mãos do opressor. A única maneira que pessoas oprimidas coloquem fim a sua opressão é por arrebatar poder: pessoas cujo poder depende da subordinação de outras não irão voluntariamente parar de oprimir. Nossa subordinação é a base do poder masculino.

Sexismo é a raíz de toda opressão

A primeira divisão de trabalho, na pré-história, foi baseada em sexo: homens caçavam, mulheres construíam as vilas, cuidavam das crianças e roçavam. Mulheres coletivamente controlavam a ilha, a linguagem, a cultura e as comunidades. Homens eram aptos a conquistar mulheres com armas que desenvolveram para caçar quando se tornou claro que mulheres estavam liderando uma existência mais estável, pacífica e desejável.  Nós não sabemos exatamente como essa conquista tomou lugar, mas está claro que o imperialismo original foi dos homens sobre as mulheres: o homem clamando o corpo feminino e seus serviços como seu território (ou propriedade).

Tendo garantido a dominação sobre mulheres, homens continuaram seu modelo de supressão de pessoas, agora nas bases da tribo, raça e classe. Apesar  de que tenha havido numerosas batalhas sobre classee, raça e nação passados três mil anos, nenhuma trouxe a libertação das mulheres. Enquanto essas outras formas de opressão devem ser terminadas, não há razão para acreditar que nossa libertação virá com a destruição do capitalismo, racismo ou imperialismo de hoje. Mulheres serão livres apenas quando se concentrarem em derrotar Supremacia Masculina.

Nossa guerra contra supremacia masculina envolve, entretanto, atacar as dominações atuais baseadas em classe, raça e nação. Como Lésbicas que estão subtraídas de qualquer grupo, seria suicídio perpetuar essas divisões feitas por homens entre nós mesmas. Nós não temos privilégios heterosexuais, e quando nós publicamente assertarmos nossa Lesbianidade, aquelas de nós que o fizeram perderam muitos de nossos privilégios de classe e raça: muitos de nossos privilégios como mulheres são concedidos a nós por nossos relacionamentos com homens (pais, maridos, namorados) a quem agora rejeitamos. Isso não significa que não há chauvinismo racista ou classista em nós mas nós precisamos destruir essas divisões remanescidas de comportamento privilegiado entre nós como primeiro passo acerca de sua destruição em nossa sociedade. Raça, classe e opressões nacionais advêm de homens, servem aos interesses da elite da classe de homens reinantes, e não têm lugar em uma revolução de mulher-identificada.*

Lesbianismo é a ameaça básica à supremacia masculina

Lesbianismo é a ameaça à base ideológica, política, pessoal e econômica da supremacia masculina. As lésbicas ameaçam ideologia da supremacia masculina por destruir a mentira da inferioridade, fraqueza, passividade da mulher, e por negar a necessidade ´inata´ de mulheres por homens (até mesmo para procriação se a ciência da clonagem for desenvolvida).

A independência Lésbica e recusa a suportar a um homem mina o poder pessoal que homens exercem sobre mulheres. Nossa rejeição do sexo heterosexualk desafia dominância masculina em sua forma mais individual e comum. Nós oferecemos a todas mulheres algo melhor que submissão à opressão pessoal. Nós ofrecemos o início do fim da supremacia masculina coletiva e individual. Desde que homens de todas raças e classes dependem de suporte e submissão femininos para trabalhos práticos e sentimento de onipotência, nossa recusa a submeter-nos irá forçar alguns a examinar seus comportamentos sexistas, a quebrar com seus próprios privilégios destrutivos sobre outros humanos e a lutar contra esses privilégios nos outros homens. Eles terão que construir novos sentidos de ser que não dependam de oprimir mulheres e aprendam a viver em esttruturas sociais que não os dê poder sobre ninguém.

Heterosexualidade separa mulheres umas das outras, ela faz mulheres definirem a si mesmas através de homens, ela força mulheres a competir umas contra as outras por homens e os privilégios que advém por intermédio deles e sua posição social. Sociedade heterosexual oferece a mulheres poucos privilégios como comprensações se elas abrirem mão de sua liberdade: por exemplo, mães são respeitadas e ´honradas´, esposas ou amantes são socialmente aceitadas e dadas alguma segurança econômica e emocional, uma mulher toma proteção física nas ruas quando ela está com seu homem, etc. Os privilégios dão a mulheres heterosexuaisum motivo.pessoal e político em manter o status quo.

A Lésbica não recebe qualquer desses privilégios heterosexuais uma vez que ela não aceita a demanda dos homens dela. Ela tem poucos interesses velados em manter o sistema político presente uma vez que todas instituições – igreja, estado, mídia, saúde, escolas – trabalham para mantê-la abaixo. Se ela compreender sua opressão, ela não tem nada a ganhar suportando a América macha branca rica e muito a ganhar de lutar para mudar isso. Ela está menos inclinada a aceitar soluções reformistas para a opressão de mulheres.

Economias são uma parte crucial da opressão de mulheres, mas nossa análise de relações entre capitalismo e sexismo não estão completas. Nós sabemos que teoria econômica marxista não considera suficientemente o papel de mulheres ou Lésbicas, e nós estamos presentemente trabalhando nessa área.

De qualquer forma, como um início, alguma das formas como Lésbicas ameaçam o sistema econômico são claras: nesse país, mulheres trabalham para homens para sobreviver, no trabalho e em suas casas. A Lésbica rejeita essa divisão de trabalho nas suas raízes; Ela recusa ser uma propriedade de um homem, a submeter-se ao sistema de trabalho mal pago de dona de casa e criação de crianças. Ela rejeita a família nuclear como a unidade básica de produção e consumo em uma sociedade capitalista.

A Lésbica é também uma ameaça ao trabalho porque ela não é a mulher passiva/turno-parcial trabalhadora com que capitalismo conta para fazer trabalho enfadonho e ser parte de um suprimendo laboral acumulativo. Sua identidade e suporte econômico não vêm de homens, então seu trabalho é crucial e ela se preocupa com condições de trabalhos, salários, promoção e status. Capitalismo não pode absorver largo número de mulheres demandando emprego estável, salários decentes, e recusando aceitar exploração de trabalho tradicional. Nós não entendemos ainda os efeitos totais dessa insatisfação crescente de trabalho que temos. Isso é, de qualquer forma, claro que uma vez que mulheres se tornam mais intencionadas em tomar controle de suas vidas, vão procurar maior controle sobre seus trabahos, por incrementar as tensões do capitalismo e incrementar o poder das mulheres para mudar o sistema econômico

Lésbicas devem formar nosso próprio movimento para reagir à supremacia masculina

Lesbianismo Feminista, como a ameça mais básica à supremacia masuclina, toma parte da análise do sexismo da Libertação das Mulheres e dá a ela força e direção. A Libertação das Mulheres carece de direção agora porque ela tem falhado em encarar classe e raça como diferenças reais nos comportamentos de mulheres e necessidades políticas. Enquanto mulheres heteros vejam Lesbianismo como uma questão privada, elas contém o desenvolvimento de políticas e estratégias que poderiam por um fim à supremacia masculina e elas dão a homens uma desculpa pra não lidar com seu sexismo.

Ser uma Lésbica significa acabar com sua identificação, sua aliança, sua dependência, e seu suporte à heterosexualidade. Significa acabar seu envolvimento no mundo masculino tanto que você se une às mulheres, individualmente e coletivamente, na luta para acabar com sua opressão. Lesbianismo é a chave para a libertação e apenas mulheres que cortarem seus laços com Privilégio Masculino podem ser acreditadas de permanecerem sérias na luta contra dominância masculina. Aquelas que se mantém ligadas a homens, individualmente ou em teoria política, não se permitem jamais pôr mulheres em primeiro lugar. Não é que mulheres heterosexuais sejam más ou não se importem com suas irmãs. Isso é porque a vera essência, definição, e natureza de heterosexualidade é homens em primeiro. Toda mulher experienciou aquela desolação quando sua irmã poe seu homem em primeiro lugar ao final de um confronto: heterosexualidade demanda que ela o faça. Enquanto mulheres ainda se beneficiarem da heterosexualidade, receber seus privilégios e segurança, elas irão em alguma hora ter de trair suas irmãs, especialmente as irmãs Lésbicas que não recebem esses privilégios.

Mulheres na Libertação de Mulheres têm entendido a importância de ter encontros e outros eventos apenas para mulheres. Tem sido claro que lidando com homens divide- nos e drena nossas energias e que não é o papel do oprimido explicar ao opressor a sua opressão.Mulheres também têm visto que coletivamente, homens não vão lidar com seu sexismo até que eles sejam forçado a isso. Mesmo assim, muitas dessas mulheres continuam mantendo relacionamentos primários com homens individualmente e não compreendem porque Lésbicas acham isso opressivo. Lésbicas não podem crescer politicamente ou pessoalmente em uma situação que nega a base de nossas políticas: que Lesbianismo é político, que heterosexualidade é crucial para manutenção da supremacia masculina.

Lésbicas devem formar nosso próprio movimento político na ordem de crescer. Mudanças que vão ter mais do que efeitos simbólicos em nossas vidas serão guiadas por Lésbicas mulheres-identificadas que entenderam a natureza de nossa opressão e que estão por isso mesmo em posição de acabá-la.

Charlotte Bunch
Para o Furies collective

Dez mentiras sobre sadomasoquismo

Posted in Uncategorized on Novembro 10, 2007 by patriarkill
Dez mentiras sobre sadomasoquismo por Melissa Farley — Media Watch
1.Dor é prazer; humilhação é desfrutável; bondage é libertação.
2. Sadomasoquismo é amor e confiança, não dominação e aniquilação.
3. Sadomasoquismo não é racista nem antisemitista mesmo quando a gente ´encena´ como senhores de escravos e africanos escravizados, nazistas e judeus perseguidos.
4. Sadomasoquismo é consensuak; ninguém se machuca se você não quer ser machucado. Ninguém nunca morreu por ´cenas´ sadomasoquistas.
5. Sadomasoquismo é apenas sobre sexo. Isso não extende-se pro resto da relação.
6. Pornografia sadomasoquista não tem relação com a sociedade sadomasoquista em que vivemos. “Se isso te faz bem, vá em frente.” “Nós criamos nossa própria sexualidade.”
7. Lesbica “no sadomasoquismo” são feministas, devotadas a mulheres, e uma comunidade só-mulheres. Pornografia lésbica é “por mulheres e para mulheres”.
8. Uma vez que lésbicas são superiores a homens, nós podemos “jogar/atuar” com sadomasoquismo numa forma libertária que heterosexuais não podem.
9. Reatuar o abuso o cura. Sadomasoquismo restaura injúrias emocionais em assalto sexual da infância.

10. Sadomasoquismo é dissidência politica. É progressivo e até “transgressivo” naquilo que quebra as regras da ideologia sexual dominante.

Embora formulada por seus atuais advogados como uma questão de libertação sexual, direitos de uma minoria, ou mesmo terapêutico, Eu considero sadomasoquismo lésbico a ser primariamente uma questão de éticas feministas. Eu acredito que lésbicas que abraçam sadomasoquismo seja teoricamente ou em prática estão suportando o sangue nutriz do patriarcado. “Os símbolos, linguagem e estilo das lésbicas-chic sadomasoquistas são os símbolos, linguagem e estilo da supremacia masculina: violação, impiedade, intimidação, humilhação, força, ridicularização, consumismo.” (De Clarke, 1993) Escolhendo sadomasoquismo, dada nossa opressão, é um ato de profunda deserção. As idéias de que estou escrevendo agora não são novas (por favor veja as referências ao final desse artigo), mas esperançosamente elas vão ser útil sumárioque poderá ser usada por feministas pra que vejam que muito do que sadomasoquistas aclamam simplesmente não são a verdade.

Mentira #1: .Dor é prazer; humilhação é desfrutável; bondage é libertação.

Isso é uma grande mentira. Parte da razão pela qual nós estamos vulneráveis a essa mentira é de que muitas de nós fomos criadas em uma cultura em que noções religiosas de que punição é amor e sofrimento é redempção. Uma jovem conhecida que militava no time da tripulação me mostrou uma camiseta que dizia: “O que não me mata vai me fazer mais forte.” Como mulheres nós somos ensinadas que amor é devoção desprendimento de si a despeito da dor sofrida. Nós acreditamos que amor é dor porque nós continuamos nos machucando nele. Mulheres são ensinadas a não acreditarem em seu senso ou intuição. Nós somos ensinadas que dor, sofrimento e humilhação são desafios pelos quais devemos ansiar porque eles ensinam coisas importanes na vida. Depois disso, o que eles poderão fazer a nós, a que mais não podem eles nos ambientar? Nós aprendemos a “consentir” com subordinação, até nos tornarmos culturalmente subservientes a isso. Se correntes e uma coleira representam rebelião e “estar no controle,” então Madonna é nossa “rebelde” Barbie e Ted Bundy seu Ken. (from Morgan, 1993)

Mentira #2: Sadomasoquismo é amor e confiança, não dominação e aniquilação.

Sadomasoquismo tem a ver com aniquilação. Contrariamente à lenda popular de que sadomasoquismo expande a sexualidade de alguém, acredito que só restringe e em últimas consequências destrói a um ser sexual. Subordinação, humilhação, e tortura são todos sinais de deliberadamente destruir o eu. Eu recentemente li um artigo sobre a forma que o patriarca do Texas Koresh entwined “sexo, violencia, amor e medo” de forma a controlar os membros de culto. Essas técnicas não são novas; pessoas têm por muito tempo machucado umas às outras em nome do amor, religião e políticas. O sadomasoquismo lésbico de hoje em dia está todo vestido de uma nova roupagem: o figurino de uma “escolha de estilo de vida,” “minoria oprimida[/marginalizada],” “liberação sexual.” Apesar da violência que revira meu estômago, Eu aprecio a candura de Jan Brown’s que dá recorte à retórica liberal sobre os prazeres do sadomasoquismo, e atinge o chão da matéria. Num artigo de Outlook, 1990, entitulado, “Sexo, Mentiras e Penetração, uma Butch Finalmente ‘admite,” Brown escreve: “Sexo que é gentil, passivo, igualitário, não nos move. [Lembram-se quando nós] emfatizavamos a simples diferença entre fantasia e realitdade? Bem, nós mentimos. O poder não é a habilidade de controlar uma imagem violenta. Ele está na volúpia de ser  sobrempoderado, forçado, machucado, usado, objetificado. Nós nos masturbamos com o estuprador, Hell’s Angel, papai, o nazi, o policial. Nós sonhamos com o sangue de alguém nas nossas mãos, com risos e choros por piedade. Algumas vezes, nós queremos nos abdicar nas mãos do enforcador. Nós queremos ter liberdade pra ignorar o ‘não’ ou ter nosso próprio ‘não’ ignorado.”

Mentira #3: Sadomasoquismo não é racista nem anti semitistamesmo que nós “atuemos” como proprietários de escravis e africanos escravizados, nazis vs judeus perseguidos.

Meu silencio sobre sadomasoquismo lésbico terminou quando eu vi duas sadomasoquistas antisemitistas num festival de mulheres. Uma das mulheres que vestia um yarmulke estava caminhando como um cachorro numa coleira em seu pescoço por uma mulher em “couros” nazistas. Quando eu protestei, a mulher em couro polidamente ouviu e concordou em remover sua própria insignia nazista e yarmulke do seu cativo. Eu tive a impressão de que ela nunca sequer considerou as implicações políticas, isto é, o anti semitismo, da “cena” que ela estava atuando. Identificar-se como/com um/a nazi (seu uniforme) em qualquer contexto, é se identificar não somente como um sadista sexualmente dominante, mas também como alguém que odeia judeus, alguém que quer que judeus sofram e sejam aniquilados. Ao mascarar-se como um judeu, (vestindo um yarmulke), preso à uma correia, não somente é se identificar como masoquista sexualmente submissivo. É também abraçar a humilhação e a tortura dos judeus sob nazi e antisemitismo: o judeu é aquele que se machuca, e aqui, veja como ela gosta disso. Alguns jornais gays liberais “censuram” anúncios da KKK, mas ainda publicam anúncios pessoais para leitores procurando por negros, ou latinos ou asiáticos escravos sexuais. Racismo parece ser mais aceitável a eles se este é erotizado. De alguma forma, se erotizada, a humilhação, sadismo e tortura do racismo e anti semitismo se torna aceitável. Tortura sempre tem um componente sexual para isso. Se uma feminista radical está para desafiar o mesmo jornal na questão do sadomasoquismo, nós seremos chamadas de “censuradoras.” Toda a questão de censura é usada pra intimidar-nos e silenciar diálogo crítico sobre sadomasoquismo.

Mentira #4: Sadomasoquismo é consensual; ninguém se machuca se você não quer ser machucado. Ninguém nunca morreu por ´cenas´ sadomasoquistas.

“Esse é o foco no desejo do bottom (o abaixo) que distingue sadomasoquismo de assalto.” (Califia, 1992) É alguma vez OK consentir com a própria humilhação e vitimização de alguém? Eu não creio. Só porque nós “consentimos” à dominação ou abuso, não significa que esta não é opressiva. “Têve uma mulher que fugiu de um assalto sexual pelo seu pai e acabou fazendo proprama por uma sobrevivência consentido? Têve uma mulher que aprendeu lições sexuais do incesto consentido com uma sexualidade na qual ela não obtém nenhum prazer uma vez que ela não possui poder?” (Cole, 1989) Teve um sobrevivente de abuso ritual, tendo passado por sua própria Inquisição na infância, consentido quando ela re-actua tortura sexual na idade adulta o que gatilha suas memórias como uma adulta? A habilidade de palavras pra machucar não deveria ser subestimada. A injúria do estupro é trazida denovo pelas palavras, armas, que nos definem como objetos e que nos dizem que nós merecemos qualquer coisa que tomamos. O auto-ódio das mulheres resulta tanto de assaltos verbais como de físicos. Alguma forma de abuso verbal está envolvida na maior parte das cenas sadomasoquistas. Quando essas palavras viciosas são transportadas pra um contexto de excitação sexual, elas possuem um impacto poderoso. Palavras sexuais sadistas contribuem para a auto-depreciação da mulher. Sadistas falam da boca pra fora de consenso, ignoram os sistemas poderosos que criam desigualdade e tornam consenso significativo impossível. Nessa cultura nós não temos experiência de relacionamentos de poder igual. “Não é o reconhecimento de todo o sadomasoquismo que ainda há em nossas psiques que conflitua com feminismo, o que nós temos problema é a falta de vontade de refletir seus significados políticos.“ ( Fritz, 1983) Violência extrema algumas vezes ocorre durante “jogos” sadomasoquistas. Eu fui informada de muitas instâncias onde palavras de “segurança” foram ignoradas durante “cena” sadomasoquista. Eu também soube que mulheres já morreram durante atividades sadomasoquistas e que essas mortes somente são abafadas – elas não são amplamente reconhecidas.

Mentira #5: Sadomasoquismo é apenas sobre sexo. Isso não extende-se pro resto da relação.

Sadomasoquismo tem tudo a ver com sexismo, racismo e classe no mundo real. É muito relacionado à auto-hostilidade internalizada. Um membro Samois escreveu:” Para ser um bom bottom [masoquista], para agradar minha amante, é um sentimento muito poderoso. As lições que aprendi na minha cama, elas podem levar a outros aspectos da minha vida e ver como isso me faz poderosa…para aproveitar cada momento do que eu estou fazendo.” (Linden et al., 1982) Eu vejo lésbicas abraçando a hierarquia de dominancia/submissão que feministas gastaram suas vidas todas tentando eliminar nas relações heterosexuais. Assim como o racismo e anti-semitismo são erotizados no sadomasoquismo, a dominação e sexismo em si mesmo são erotizados nas relações sadomasoquistas. A relacionamento sexual sadista estabelece o tom pro resto da relação. Submetendo e desistindo durante um desacordo, por exemplo, se torna um ato sexual. E violência física real pode e de fato ocorre como natural extensão de desigualdade na relação sexual. Bater em alguém é usualmente um ato sadista. Assédio e estupro ocorrem em relacionamentos lésbicos – e eles são normalizados pelos modelos sexualmente dados. O sarcasmo coercitivo e dominante do sadista é algumas vezes forçado pra dentro de nossas comunidades. Em 1988, eu postei uma notícia para uma oficina chamada “Os efeitos das práticas sexuais sadistas/violentas em não-partipitantes: um grupo suporte; fechado para participantes sadomasoquistas e advogadores.” Assim que um pequeno grupo de nós sentou no chão e começou a conversar, seis ou sete mulheres com chicotes vieram e ficaram, de braços cruzados, atrás de nós. Elas não disseram nada; a intenção de intimidar estava clara. Outro exemplo dos efeitos pervasivos do sadomasoquismo numa comunidade ocorreram em 1990, quando os organizadores de um largo festival de mulheres escreveram sobre como atividade sadomasoquista de algumas mulheres inflingia no direito de outras mulheres de “se moverem livremente e seguramente sem medo e horror.”

Mentira #6: Pornografia sadomasoquista não tem relação com a sociedade sadomasoquista em que vivemos. “Se isso te faz bem, vá em frente.” “Nós criamos nossa própria sexualidade.”

Nós internalizamos fantasias sadomasoquistas porque esta é a sexualidade que nos foi empurrada pelas gargantas desde o dia em que nascemos. Como mulheres fomos criadas pra sermos os “bottoms:” lésbicas “bottoms” tendem a exceder “tops” [sadistas] de 10 pra 1. “O que te faz bem” é largamente construido pela opressão social: racismo, sexismo, classismo. Nós nascemos com uma sexualidade inata onde nenhum desses elementos são aprendidos ou manipulados. Mesmo que muitos liberais,advogadores pro-pornografia neguem qualquer relação entre sadomasoquismo e a violência no resto da cultura. Já não é mais possível discontar os efeitos causais da pornografia na violência contra mulher. Diana Russell recentemente publicou um sumário de pesquisa sobre as formas em que pornografia foi mostrada pra causar prejuízo à mulheres. (Russell, 1993) Eu acredito que seu argumento pode ser aplicado a pornografia lésbica exatamente da mesma forma: pornografia, seja hetero ou lésbica, promove desigualdade e erotiza os relacionamentos desiguais. Atualmente, assim como nossos hábitos de comer, sexualidade é completamente condicionável. Quando nós ensaiamos abuso sadista na fantasia, pornografia, e jogos sexuais, nós legitimamos sua autoridade em nossas mentes, e podemos acabar ajudando outras autoridades nas nossas vidas a manter-nos em sujeição de outras formas. Sadomasoquismo está por toda parte nessa cultura – só dê uma boa olhada ao seu lugar de trabalho, sua família, sua igreja.

Mentira #7: Lesbica “no sadomasoquismo” são feministas, devotadas a mulheres, e uma comunidade só-mulheres. Pornografia lésbica é “por mulheres e para mulheres”.

Pat Califía disse que preferia estar fixada numa ilha deserta com um garoto masoquista do que com uma lésbica baunilha.

Bottoms são vistos como “genericos, trocáveis, e substituíveis.” (Califia, 1992) Califia está comprometida com a regra do sadista, não com qualquer preferência sexual particular.” Sexo definido como uma commodity/mercadoria [sadomasoquismo] leva ao mercado onde o gênero de uma prostituta e cliente é irrelevante comparado ao tipo e custos dos serviços providos.” (Clarke, 1993) Enquanto lésbicas que estão “no sadomasoquismo”definem a si  mesmas como lésbicas, suas práticas sadomasoquistas são bisexuais. Eu não tenho nenhuma crítica política à bissexualidade – o que eu estou criticando é a postura sadomasoquista como sendo a de lésbicas devotadas da comunidade de mulheres. Pornografia pseudolésbica, isso é, fotos de mulheres que estão imitando comportamentos ´lesbians’, tem sindo um elemento favirecido na pornografia masculina heterosexual desde que esta foi primeiramente publicada. Ela vende. Apesar do fato de que esta é muitas vezes promovida como sendo autorada e distribuida por e para mulheres, pornografia “lésbica” vende vorazmente à homens heteros.

Mentira #8: Uma vez que lésbicas são superiores a homens, nós podemos “performar” com sadomasoquismo numa forma libertária que heterosexuais estão impedidos.

Eu não penso que mulheres são biologicamente superiores a homens. De fato, eu vejo essa noção como perigosa e reacionária: “Anatomia é destino” não é exatamente uma idéia feminista. Atitudes e comportamentos sadistas e masoquistas entre lésbicas, de fato, são bom exemplo de como nós internalizamos idéias abusivas assim como todo mundo faz. Nós estamos seduzidas pela dominação masculina – porque nós vemos que é ali que poder reside. A gente ainda se ilude se pensarmos que é possível “encenar” o estuprador sem se tornar o estuprador.

Mentira #9: Reatuar o abuso o cura. Sadomasoquismo restaura injúrias emocionais em assalto sexual da infância.

Isso é uma mentira e realmente me perturba. Uma grande porcentagem de mulheres “no  sadomasoquismo” tem histórias de assalto sexual na infância, do que aquelas que não são participantes em sadomasoquismo. Mesmo assim, sadomasoquismo obscurece a verdadeira dor e abuso de mulheres.Como pode você dizer que a diferença entre “real” e “fingido”  quando alguém tem flashbacks e se torna a criança denovo no meio da tortura sexual “consensual”? Algumas sentem um desejo intenso, até mesmo compulsivo em torno de aniquilação sexual que é expressa em atividade sadomasoquista que espelha o abuso sofrido quando crianças. A noção de que atuar o abuso é terapêutico e o elimina vem da teoria da catarse: faça isso uma vez, traga isso pra fora seu sistema, então você vai sair dele. Não há evidência de que a catarse trabalhe como uma solução para conflito social ou psicológico, ainda assim essa teoria é usada pra racionalizar a disseminação de pornografia. Pornografia não parece ter servido como uma panela de pressão libertária para homens, fazendo assim com que mulheres se libertem do estupro. Ao contrário, pornografia parece ter funcionado como uma propaganda pro-estupro. Catarse sadomasoquista não parece recuperar o abuso de qualquer forma: uma mulher escreveu “depois de dezesete anos de[abuso sexual infantil], as lésbicas que conheci apenas queriam que eu fizesse mais do mesmo. Eu tive pesadelos e prejuízo de ambos.” (Anonima, 1990) Sadomasoquismo é a repetição, não a terapia, de abuso sexual infantil. Alguns sugeriram que sadomasoquismo pode atualmente ser psicologicamente viciante. Eu ouvi de mulheres descrevendo a si mesmas como estando “em recuperação do sadomasoquismo,” da mesma forma que elas falam de adicção alcóolica. Talvez a adicção física a certos tipos de traumas começa com complexas reações físicas para prolongar o abuso na infância que é então revivido nos relacionamentos sadomasoquistas adultos.

Mentira #10. Sadomasoquismo é dissidência politica. É progressivo e até “transgressivo” naquilo que quebra as regras da ideologia sexual dominante.

A postura de sadistas e masoquistas como “transgressiva” pode estar confundindo aqueles que não são familiar a teoria feminista. Por definição, o objetivo último do feminismo é acabar com sadomasoquismo. Nosso sistema é sadomasoquista ao seu extremo, como celebrar isso pode ser qualquer forma de rebelião verdadeira? (Fritz, 1983). Os valores políticos do sadismo são ofensivamente antifeministas, totalitários e direitistas. Sadomasoquismo é negócio como sempre; relações de poder como sempre; raça, gênero e classe como sempre. Sadomasoquismo é uma versão ritual de dominância e submissão. Sadomasoquismo não é um desvio criativo da norma comportamental heterosexual. É a exata definição qualitativa das relações entre homens e mulheres. Sadismo é a extenção lógica do comportamento que surge do poder masculino. ( Wagner, 1982 ) Nós vivemos num mundo misoginista, e mulheres tem tão pouco poder político, que é fácil fantasiar sobre absoluto poder pessoal do que com organização política por mudança. (Clarke, 1993). Muitas jovens lésbicas recentemente disseram pra mim que suas fantasias com sadomasoquismo eram sua “salvação” num mundo onde elas não vêem qualquer possibilidade de obter poder real. Dykes sadomasoquistas jogam-atuam poder e prestígio num mundo que destrói qualquer esforço de organizar por poder real. O jogo-performance ajuda-nos a esquecer o quanto a gente é odiada e prejudicada. E esquecer é que é o real perigo.

(para contatar a autora escreva: mfarley@prostitutionresearch.com)

Referencias:
Anonymous, letter to Lesbian Connection, January-February 1990, Vol. 12, Issue 4, page 11.
Atkinson, Ti-Grace. Amazon Odyssey, 1974.
Brown, Jan. “Sex, Lies, and Penetration, a Butch Finally ‘Fesses Up,” Outlook, 1990.
Califia,Pat. “The Limits of the S/M Relationship,” in Outlook, Winter, 1992, pages 16-21.
Clarke, De. “Consuming Passions: some thoughts on history, sex, and free enterprise,”
in Unleashing Feminism: critiquing Lesbian Sadomasochism in the Gay Nineties,” (Irene Reti, ed.), 1993, HerBooks, Santa Cruz, CA.
Cole, Susan. Pornography and the Sex Crisis, 1989.
Dworkin, Andrea. Pornography: Men Possessing Women, New York, Putnam’s, 1979.
Dworkin, Andrea. Woman Hating, New York, E.P. Dutton, 1974.
Fritz, Leah. “Is there Sex after Sadomasochism?” Village Voice, Nov. 1, 1983, pages 24-25.
Linden, Robin R.; Pagano, Darlene R.; Russell, Diana E.H.; Star, Susan
Leigh (eds.) Against Sadomasochism, a Radical Feminist Analysis, 1982.
Millett, Kate. Sexual Politics, New York, Doubleday, 1970.
Morgan, Robin, Editorial, Ms., May-June, 1993, Vol. III, Number 6
Morgan, Robin. The Demon Lover: on the Sexuality of Terrorism, 1989
Reti, Irene. “Remember the Fire: Lesbian Sadomasochism in a post-Nazi
Holocaust World”, in Unleashing Feminism: critiquing Lesbian
Sadomasochism in the gay nineties, (Irene Reti, ed.), HerBooks,
Santa Cruz, CA.
Russell, Diana E. H. Against Pornography: the Evidence of Harm, Russell
Publications, 2018 Shattuck Ave., Berkeley, CA, 94704, 1993.
Wagner, Sally Roesch, in Linden, et al, Against Sadomasochism, 1982.